Muitos são os santos do Antigo Testamento contemplados pelo calendário litúrgico bizantino e celebrados num dia particular. Em geral não encontramos a celebração correspondente no contexto católico romano. No dia 20 de julho no Oriente se comemora o profeta Elias, “santo e glorioso,” conforme aparece no título do Minéon. Não possuímos escritos desse profeta que viveu no IX século antes de Cristo, mas ele se destaca entre os “profetas de ação” em Israel. Inúmeras vezes, nos livros sagrados, se fala do seu zelo em defender a verdadeira fé e piedade, como também da sua vida austera e rica em milagres, que se concluiu de maneira extraordinária. Com efeito Elias, num carro de fogo, “subiu no turbilhão para o céu” na presença de Eliseu, que herdou seu espírito. É um detalhe, esse, muito evidenciado no Oriente. Dão testemunho disso os muitos ícones, mormente russos, que representam Elias arrebatado da terra para as esferas celestes, numa carruagem puxada por cavalos chamejantes. Desde as Vésperas, já encontramos uma alusão a esse episódio e, nos tropários sucessivos, se fala do seu epifânico conhecimento de Deus, que se lhe manifestou no monte Horeb como no meio de uma “brisa suave.” Os textos falam também da morte dos falsos profetas, depois da prova no monte Carmelo, da longa estiagem, sinal da punição divina e de outros episódios da sua vida. As três leituras bíblicas, excepcionalmente longas, lidas na tarde do dia 19 de julho, são extraídas do terceiro livro dos Reis (correspondente a lReis da Vulgata). Primeiramente se lê o capítulo 17 inteiro, depois uma boa parte dos capítulos 18 e 19. Na última leitura se lêem os versículos finais do capítulo 19, que tratam da vocação de Eliseu, e 2Reis (2,1 14) em que é narrado o episódio do manto que caíra dos ombros de Elias e que Eliseu apanhara, herdando assim também o seu espírito.
No tropário conclusivo, e no kontákion, assim é lembrado o profeta que apareceu junto com Moisés, na Transfiguração de Cristo:
Tropário Modo 4
“Anjo na carne, fundamento dos profetas,
segundo precursor da vinda do Cristo,
o glorioso Elias, que do alto faz descer a graça sobre Eliseu,
afasta as doenças e purifica os leprosos.
Sobre os que o veneram faz jorrar as curas.”
Kontákion Modo 2
“Profeta de sublime nome, Elias,
que prevês os grandes feitos do nosso Deus
e submetes à tua palavra as nuvens portadoras de chuva,
roga por nós ao único Amigo dos homens.”
O profeta, nascido em Tesbes, além do Jordão, no país de Galaad, desde a primeira infância teve sonhos prodigiosos. Essa tradição foi transmitida por Santo Epifânio de Chipre e a encontramos escrita numa estrofe da Ode primeira do Cânon:
“Na hora do teu nascimento, ó profeta bem aventurado, teu pai teve a revelação dum grande milagre, pois te viu nutrido por uma chama e envolvido em faixas chamejantes; por teus rogos, pois, livra nos do fogo eterno.”
O nome do profeta Elias significa “o meu Deus é IHVH” — indica pois um programa de vida. Isso é demonstrado em numerosos episódios que o “próprio” do Ofício bizantino no dia 20 de julho, como sempre marcadamente baseado na Bíblia, várias vezes recorda e exalta. Em um breve hino das Vésperas encontramos:
“Tu paraste as águas do céu e por um corvo foste nutrido, confundiste os reis e fizeste morrer os sacerdotes de Baal; do alto do céu fizeste descer o fogo e por duas vezes fizeste perecer cinquenta homens; tu alimentaste a viúva de Sarepta com o óleo e o pouco de farinha que lhe restava e por tua oração ressuscitaste lhe o filho; acendeste o fogo sobre o altar encharcado e andaste sobre as águas do rio Jordão; enfim foste arrebatado ao céu sobre um carro de fogo e agraciaste duplamente a Eliseu: intercede sem cessar junto de Deus, pela salvação das nossas almas.”
A figura austera do profeta, suscitado por Deus para combater a idolatria no povo de Israel sob o reinado de Acab e de Ocozias, é ainda hoje venerado também pelos hebreus e pelos árabes. Para os cristãos bizantinos, a figura de Elias é ocasião de lembrar o ensinamento evangélico, como no texto deste ikos que apresentamos como conclusão:
“Ao ver a grande iniquidade dos homens e o grande amor de Deus para com eles, o profeta Elias irritou se e, indignado, dirigiu se ao Deus de misericórdia com palavras impiedosas dizendo: ‘ó justo juiz, vinga te contra os que transgridem a tua lei!' Mas Deus, em sua ternura, não quis punir os que o haviam ofendido: como sempre, o único amigo dos homens aguarda a conversão de todos.”
Leituras ComemorativasLucas 4:22-30 MatinasTiago 5:10-20Lucas 4:22-30
Oração Antes de Ler as Escrituras
Faz brilhar em nossos corações a Luz do Teu divino conhecimento, ó Senhor e Amigo do homem; e abre os olhos da nossa inteligência para que possamos compreender a mensagem do Teu Santo Evangelho. Inspira-nos o temor aos Teus Santos mandamentos, a fim de que, vencendo em nós os desejos do corpo, vivamos segundo o espírito, orientando todos os nossos atos segundo a Tua vontade; pois Tu És a Luz das nossas almas e dos nossos corpos, ó Cristo nosso Deus e nós Te glorificamos a Ti e ao Teu Pai Eterno e ao Espírito Santo, Bom e Vivificante, eternamente, agora e sempre e pelos séculos dos séculos. Amém!
1 Coríntios 13:4-14:5
Mateus 20:1-16
1 Porque o reino dos céus é semelhante a um homem, proprietário, que saiu de madrugada a contratar trabalhadores para a sua vinha. 2 Ajustou com os trabalhadores o salário de um denário por dia, e mandou-os para a sua vinha. 3 Cerca da hora terceira saiu, e viu que estavam outros, ociosos, na praça, 4 e disse-lhes: Ide também vós para a vinha, e dar-vos-ei o que for justo. E eles foram. 5 Outra vez saiu, cerca da hora sexta e da nona, e fez o mesmo. 6 Igualmente, cerca da hora undécima, saiu e achou outros que lá estavam, e perguntou-lhes: Por que estais aqui ociosos o dia todo? 7 Responderam-lhe eles: Porque ninguém nos contratou. Disse- lhes ele: Ide também vós para a vinha. 8 Ao anoitecer, disse o senhor da vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga-lhes o salário, começando pelos últimos até os primeiros. 9 Chegando, pois, os que tinham ido cerca da hora undécima, receberam um denário cada um. 10 Vindo, então, os primeiros, pensaram que haviam de receber mais; mas do mesmo modo receberam um denário cada um. 11 E ao recebê-lo, murmuravam contra o proprietário, dizendo: 12 Estes últimos trabalharam somente uma hora, e os igualastes a nós, que suportamos a fadiga do dia inteiro e o forte calor. 13 Mas ele, respondendo, disse a um deles: Amigo, não te faço injustiça; não ajustaste comigo um denário? 14 Toma o que é teu, e vai-te; eu quero dar a este último tanto como a ti. 15 Não me é lícito fazer o que quero do que é meu? Ou é mau o teu olho porque eu sou bom? 16 Assim os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos.
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COMENTÁRIOS
Estes homens queriam trabalhar, porém ninguém os contratou; eram trabalhadores, mas ociosos por falta de trabalho e de Senhor. Em seguida uma voz lhes contratou, uma palavra os colocou no caminho e, em seu zelo, não combinaram o preço de seu trabalho como fizeram os primeiros. O Senhor avaliou seu trabalho com prudência, e lhes pagou tanto como aos demais.
Nosso Senhor pronunciou esta parábola para que ninguém diga: Visto que não fui chamado quando era jovem, não posso ser recebido. Ensinou que, seja qual for o momento de sua conversão, todo homem é acolhido... Saiu ao amanhecer, ao meio da manhã, ao meio-dia, no meio da tarde, e ao final da tarde: com o que dá a entender desde o início de sua pregação, depois ao longo de sua vida até a cruz porque é à hora undécima que o ladrão entrou no paraíso. Para que ninguém reclame do ladrão, nosso Senhor afirma sua boa vontade; se lhe tivessem contratado antes, teria trabalhado: Ninguém nos contratou.
Aquilo que damos a Deus é muito pouco digno dele, e o que ele nos dá é muito superior a nós. Somos contratados para um trabalho proporcionado às nossas forças, porém nos propõe um salário muito acima do que o nosso trabalho merece... Trata-se da mesma forma aos primeiros e aos últimos; receberam um denário cada um com a imagem do Rei. Tudo isto significa o Pãoda vida que é o mesmo para todos; é único o remédio de vida para aqueles que o comem.
No trabalho da vinha não se pode reprovar ao Senhor sua bondade, e nada tem a se dizer de sua retidão. Segundo sua retidão dava como achava justo, e, segundo sua bondade, mostra a sua misericórdia como quer. É para dar-nos este ensinamento que nosso Senhor disse esta parábola, e a resumiu com estas palavras: Eu não tenho liberdade para fazer o que quiser em meus assuntos?
Santo Efrém, (séc. IV) Diatessaron 15,15-17
O Denário é a Vida Eterna
Acabais de escutar a parábola evangélica dos trabalhadores da vinha, que encaixa perfeitamente com a presente estação. Pois agora nos encontramos na época da vindima material. E digo “material”, porque existe uma vindima “espiritual”, na qual Deus se alegra com os frutos de sua vinha. O Reino dos Céus se assemelha a um proprietário que saiu para contratar trabalhadores para a sua vinha.
o que significa esse gesto de pagar a diária começando pelos últimos? Não lemos em outra passagem do Evangelho que todos receberão simultaneamente a recompensa? De fato, lemos em outro texto do Evangelho que o rei dirá àqueles que estiverem a sua direita: Vinde, benditos de meu Pai; herdai o reino que está preparado para vós desde a criação do mundo. Portanto, se todos receberão o denário ao mesmo tempo, como entender o que aqui se diz sobre que primeiro receberão a diária os contratados ao entardecer, e, por último, os do amanhecer? Se consigo explicar-me de modo que consigais entendê-lo, louvado seja Deus. Pois a ele deveis agradecer pelo que vos concede pela minha mão: porque o que vos dou não o dou de minha colheita.
Se perguntas, por exemplo, quem dos dois trabalhadores recebeu o pagamento primeiro: o que o recebeu depois de uma hora de trabalho ou aquele que o recebeu depois de uma jornada laboral de doze horas, todos responderão que quem o recebeu ao final de somente uma hora, o recebeu antes daquele que o recebeu depois de doze horas. Assim, ainda que todos cobrassem ao mesmo tempo, contudo, como alguns receberam a diária ao final de uma hora e os outros depois de doze horas, diz-se que aqueles a receberam primeiro, posto que a receberam em breve espaço de tempo.
Os primeiros justos como Abel, Noé, que são os chamados na primeira hora, receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Posteriormente, outros justos depois deles, tais como Abraão, Isaac, Jacó e seus contemporâneos, chamados ao meio da manhã, receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Outros justos: Moisés, Aarão e aqueles que com eles foram chamados ao meio-dia, receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Depois deles, os santos profetas, chamados como ao cair da tarde, receberão ao mesmo tempo que nós a felicidade da ressurreição. Ao final do mundo, todos os cristãos, como os chamados à hora undécima, receberão juntamente com eles a felicidade da ressurreição. Todos a receberão ao mesmo tempo, porém observai após quanto tempo os primeiros a receberão. Portanto, se os primeiros chamados recebem a felicidade depois de tanto tempo, ao passo que nós a recebemos depois de um breve intervalo, mesmo que todos a recebamos simultaneamente, parece como se nós a recebêssemos primeiro, porque nossa recompensa não se fará esperar.
No que se refere à retribuição, todos seremos iguais: os últimos como os primeiros, e os primeiros como os últimos, pois aquele denário é a vida eterna, e na vida eterna todos serão iguais. E apesar de que, conforme a diversidade de méritos, brilharão de forma diversa, no que se refere à vida eterna, ela será igual para todos. Não será mais longo para um e mais curto para outro o que em ambos os casos será sempiterno: o que não tem fim, não terá nem para ti nem para mim. Ali brilharão de forma diferente a castidade conjugal e a integridade virginal; um será o fruto das boas obras e a outra a coroa do martírio; porém, no que se refere a viver eternamente, nem este viverá mais que aquele, nem aquele mais do que este. Todos viverão uma vida sem fim, embora cada um com seu brilho e auréola peculiar. E aquele denário é a vida eterna.
Santo Agostinho (Séc. IV)
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