domingo, 3 de novembro de 2024

19º Domingo Depois de Pentecostes

03 de Novembro de 2024 (CC) / 21 de Outubro (CE)
Ss. Higúmeno Hilarião, o Grande, mon. († 371);  Cristodolus de Patmos. 
Traslado das santa relíquias de São Hilario, bispo de Meglina, Bulgária (1164)
Tom 2



Nos primeiros séculos da história cristã, não havia conventos na Palestina, até a chegada de Hilarião. Filho de pagãos, nasceu no ano 291, em Tebata, na Palestina. Na idade adequada, foi enviado para estudar na Alexandria, no Egito. Lá, teve influência de Áquila, fez muitos contatos com cristãos, estudou a religião e converteu-se ao cristianismo.
 
Tornou-se um verdadeiro cristão. Vivia em oração e nas mais duras penitências, desejando purificar-se para alcançar a santidade. Decepcionado com a futilidade de vida urbana de Alexandria, foi para o deserto de Tebaida, onde se juntou à comunidade do monge Antão, famoso pela extraordinária experiência de vida santa no deserto. Com ele aprendeu a base da vida eremítica: orações contemplativas, duras mortificações e severas penitências, para comungar com Deus, purificar-se e, assim, alcançar a santidade.  
Aos poucos, contudo, foi se cansando com a grande movimentação de pessoas que buscavam os conselhos e orientação de santo Antão. Até que decidiu abandonar a comunidade e ir para sua terra natal. Lá, em seguida, com muita tristeza no coração, assistiu à morte dos seus pais. Dividiu sua parte da herança com os irmãos e os pobres e entregou-se nas mãos da Divina Providência, retirando-se para o deserto de Maiuma, não muito distante. Sua permanência mudou o panorama da Igreja na Palestina.  
As penitências de Hilarião e sua extrema fé no Senhor começaram a operar prodígios. Curou muitos doentes com uma simples oração e o sinal da cruz. Converteu milhares de pessoas através de seus sermões. Mas para seu desgosto viu sua fama ganhar o mundo. De repente, deu-se conta de que à sua volta estavam cerca de três mil pessoas ansiosas em seguir seu modo radical de vida dedicada a Deus. Não teve alternativa senão construir vários mosteiros para abrigar todos esses discípulos. Por esse motivo é considerado padroeiro dos monges locais.  
Novamente, a grande movimentação de pessoas, agora à sua procura, o fez buscar a solidão, vital para Hilarião, que por ela entrava em comunhão com Deus. Voltou para o Egito. Mas a fama de santidade nunca mais o abandonou. Era o abade que atraía leigos e religiosos, pobres e ricos, onde quer que estivesse, e que procurava o local ideal para viver sua espiritualidade. Então, foi para o Ocidente, na Sicília. De lá partiu para a Dalmácia e depois para Chipre, onde se encontrou com outro importante monge e padre do deserto, santo Epifânio.  
Assim, Hilarião, após as longas jornadas, esquivando-se da fama, encontrou a paz e a solidão quando passou a habitar uma gruta da pequena ilha de Pafo, Chipre. Já idoso, lá viveu a plenitude de sua vida de religioso.  
Morreu aos oitenta anos, em 372. O seu corpo, entregue ao discípulo Eusébio, foi trasladado para o Mosteiro de Maiuma. São Jerônimo narrou a historia de sua vida. Santo Hilarião é festejado no dia 21 de outubro tanto na Igreja ocidental como na oriental. 

 

 Oração Antes de Ler as Escrituras

Faz brilhar em nossos corações a Luz do Teu divino conhecimento, ó Senhor e Amigo do homem; e abre os olhos da nossa inteligência para que possamos compreender a mensagem do Teu Santo Evangelho. Inspira-nos o temor aos Teus Santos mandamentos, a fim de que, vencendo em nós os desejos do corpo, vivamos segundo o espírito, orientando todos os nossos atos segundo a Tua vontade; pois Tu És a Luz das nossas almas e dos nossos corpos, ó Cristo nosso Deus e nós Te glorificamos a Ti e ao Teu Pai Eterno e ao Espírito Santo, Bom e Vivificante, eternamente, agora e sempre e pelos séculos dos séculos. Amém!


MATINAS (8)

João 20:11-18

Fragmento 64 – Naqueles dias, Maria, estava em pé, diante do sepulcro, a chorar. Enquanto chorava, abaixou-se a olhar para dentro do sepulcro, e viu dois anjos vestidos de branco sentados onde jazera o corpo de Jesus, um à cabeceira e outro aos pés. E perguntaram-lhe eles: Mulher, por que choras? Respondeu-lhes: Porque tiraram o meu Senhor, e não sei onde o puseram. Ao dizer isso, voltou-se para trás, e viu a Jesus ali em pé, mas não sabia que era Jesus. Perguntou-lhe Jesus: Mulher, por que choras? A quem procuras? Ela, julgando que fosse o jardineiro, respondeu-Lhe: Senhor, se Tu o levaste, dize-me onde o puseste, e eu o levarei. Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, virando-se, disse-Lhe em hebraico: Raboni! - que quer dizer, Mestre. Disse-lhe Jesus: Deixa de me tocar, porque ainda não subi ao Pai; mas vai a meus irmãos e dize-lhes que Eu subo para Meu Pai e vosso Pai, Meu Deus e vosso Deus. E foi Maria Madalena anunciar aos discípulos: Vi o Senhor! E que Ele lhe dissera estas coisas.

LITURGIA

Tropárion da Ressurreição
Ó Vida Imortal, sofrendo a morte, / esmagaste o Inferno com o fulgor de Tua Divindade. / E quando fizeste erguer os mortos das profundezas da terra, / todos os Poderes Celestes Te aclamaram, dizendo: // “Glória a Ti, ó Cristo nosso Deus e Autor da Vida!”

Tropárion de São Mateus, Tom 3 (Santo Patrono)
Com zelo seguiste a Cristo, o Mestre, / Que em Sua bondade apareceu aos homens na Terra, / E da alfândega te chamou para Apóstolo / e Pregador do Evangelho ao universo, /por isto honramos tua preciosa memória. / Ó divinamente eloquente, Mateus. /Roga ao Deus misericordioso // que nos conceda a remissão das transgressões e a salvação das nossas almas!

Tropárion de São Hilárion, Tom 8
Com torrentes de tuas lágrimas tu irrigaste o deserto árido, / e com suspiros das profundezas de tua alma tu o fizeste dar frutos cem vezes mais./ Tu foste um farol para o mundo inteiro, irradiando milagres. // Ó Hilarion, nosso pai, implora a Cristo Deus, que nossas almas sejam salvas!

Kondákion da Ressurreição
Tu ressuscitaste do túmulo, Ó Onipotente Salvador, / e com esse forte sinal, o Inferno tomou-se de medo, / os mortos ressuscitaram e a criação Contigo se alegra / e Adão fica inexcedivelmente jubilante; //e o mundo, ó meu Salvador, a Ti louva para sempre.

Kondákion de São Mateus, Tom 4 (Santo Patrono)
Deixando os laços da alfândega para adquirir o jugo da Justiça, / tu te revelaste um sábio comerciante, rico da sabedoria do Alto. / Proclamaste a Palavra da Verdade, /e pela narrativa da hora do Juízo // despertaste as almas indolentes.

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo ...

Tom 3: Reunidos hoje, em hinos nós te louvamos / como uma luminária que nunca declina do Sol noético; / pois tu brilhaste sobre aqueles / na escuridão da ignorância, / guiando todos para as alturas divinas, ó Hilarion. / Por isso, clamamos: / Alegra-te, ó pai, // tu fundação de todos os jejuadores!

Agora e sempre e pelos séculos dos séculos.

Theotókion
Ó Admirável Protetora dos Cristãos e nossa Medianeira ante o Criador, / não desprezes as súplicas de nenhum de nós pecadores, / mas, apressa-te a auxiliar-nos como Mãe Bondosa que és, / pois, te invocamos com fé. / Roga por nós, junto de Deus, // tu que defendes sempre aqueles que te veneram.

Prokímenon

R. O Senhor, É a minha força e o meu cântico,
porque ele me salvou. (Sl. 117:14)

V. O Senhor, castigou-me muito,
mas não me entregou à morte. (Sl. 117:18)

No 7º Tom: 

Preciosa aos olhos do Senhor é a morte de Seus santos.

2 Coríntios 11:31-12:1-9

Fragmento 194 - Irmãos, o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que é eternamente bendito, sabe que não minto. Em Damasco, o que governava sob o Rei Aretas pôs guardas às portas da cidade dos damascenos, para me prenderem. E fui descido num cesto por uma janela da muralha; e assim escapei das suas mãos. Em verdade que não convém gloriar-me; mas passarei às visões e revelações do Senhor. Conheço um homem em Cristo que há catorze anos (se no corpo, não sei, se fora do corpo, não sei; Deus o sabe) foi arrebatado ao terceiro céu. E sei que o tal homem (se no corpo, se fora do corpo, não sei; Deus o sabe) foi arrebatado ao paraíso; e ouviu palavras inefáveis, que ao homem não é lícito falar. De alguém assim me gloriarei eu, mas de mim mesmo não me gloriarei, senão nas minhas fraquezas. Porque, se quiser gloriar-me, não serei néscio, porque direi a verdade; mas deixo isto, para que ninguém cuide de mim mais do que em mim vê ou de mim ouve. E, para que não me exaltasse pela excelência das revelações, foi-me dado um espinho na carne, a saber, um mensageiro de Satanás para me esbofetear, a fim de não me exaltar. Acerca do qual três vezes orei ao Senhor para que se desviasse de mim. E disse-me: “A minha graça te basta, porque o meu poder se aperfeiçoa na fraqueza”. De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas, para que em mim habite o poder de Cristo.

2 Coríntios 9:6-11

Fragmento 188 - Irmãos, isto digo: Aquele que semeia pouco, pouco ceifará; e aquele que semeia em abundância, em abundância ceifará. Cada um contribua conforme propôs no seu coração, não com tristeza ou por necessidade, porque Deus ama ao que doa com alegria. E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência, superabundeis em toda boa obra. Como está escrito: 

“Ele espalhou; deu aos pobres; a sua justiça permanece para sempre”.

Ora, aquele que dá a semente ao que semeia, também vos dará pão para comer, e multiplicará a vossa sementeira, e aumentará os frutos da vossa justiça. Sendo enriquecidos em tudo para toda a abundância, o que faz com que por nós demos graças a Deus.

Aleluia

O Senhor te ouça no dia da tribulação;
Te proteja o Nome do Deus de Jacó!

Aleluia, aleluia, aleluia!

Salva, Senhor, pois ao Rei clamamos!
Que Ele nos escute!

No 6º Tom: 

Bem-aventurado é o homem que teme ao Senhor,
em Seus mandamentos ele se deleitará grandemente.

Aleluia, aleluia, aleluia!

Lucas 16:19-31

Fragmento 83A - O Senhor disse aos Seus Discípulos: Havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente. Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele; e desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lhe lamber as chagas. E aconteceu que o mendigo morreu, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico, e foi sepultado. E no hades, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão, e Lázaro no seu seio. E, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e manda a Lázaro, que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro somente males; e agora este é consolado e tu atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá passar para cá. E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai, Pois tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, pai Abraão; mas, se algum dentre os mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém, Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite.

Lucas 6:17-23

Fragmento 24 - Naquela época, Jesus descendo com eles, parou em uma planície, na companhia de Seus discípulos, e uma grande multidão de povo de toda a Judeia e Jerusalém, e do litoral de Tiro e de Sidom, que tinham vindo para ouvi-Lo, e para serem curados das suas enfermidades; e os que eram atormentados por espíritos imundos, e eles eram curados. E toda a multidão procurava tocar-Lhe; porque saía virtude d’Ele, e curava a todos. E Ele levantando os olhos para os Seus discípulos, disse:

Bem-aventurados sois vós, os pobres; porque vosso é o Reino de Deus.
Bem-aventurados sois vós, que agora tendes fome; porque sereis fartos.
Bem-aventurados sois vós, que agora chorais; porque haveis de rir. 
Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem, e quando eles vos separarem da sua companhia, e vos insultarem, e rejeitarem o vosso nome como mau, por causa do Filho do Homem. Regozijai-vos nesse dia, e salteis de alegria, porque eis que é grande a vossa recompensa no céu; porque de maneira semelhante faziam os seus pais aos profetas.

† † †

HOMILIAS

“Deus Aceita os Dons Para o Seu Templo, 
Lhe Agradam, No Entanto, Muito Mais As Oferendas Que Se Dão Aos Pobres”

Desejas honrar o corpo de Cristo? Não o desprezes, pois, quando o contemples nu nos pobres, nem o honres aqui, no templo, com lenços de seda, se ao sair o abandonas em seu frio e nudez. Porque o mesmo que disse: Isto é o meu corpo, e com sua palavra trouxe à realidade o que dizia, afirmou também: Tive fome e não me destes de comer, e mais adiante: Sempre que o deixastes de fazer a um destes pequeninos, a mim o deixastes de fazer. O templo não necessita de vestes e lenços, mas pureza de alma; os pobres, porém, necessitam que com muita dedicação nos preocupemos com eles.

Reflitamos, portanto, e honremos a Cristo com aquela mesma honra com que ele deseja ser honrado; pois, quando se quer honrar a alguém, devemos pensar na honra que lhe agrada, e não no que nos satisfaz. Também Pedro quis honrar ao Senhor quando não permitiu deixar-se lavar os pés, mas o que ele queria impedir não era a honra que o Senhor desejava, mas sim o contrário. Assim, tu deves prestar ao Senhor a honra que ele mesmo te indicou, distribuindo tuas riquezas aos pobres. Pois Deus certamente não tem necessidade de taças de ouro, mas, ao contrário, deseja almas de ouro.

Não digo isto com intenção de proibir a entrega de dons preciosos para os templos, mas que, junto com estes dons e até mesmo acima deles, deve-se pensar na caridade para com os pobres. Porque, se Deus aceita os dons para o seu templo, lhe agradam, no entanto, muito mais as oferendas que se dão aos pobres. De fato, da oferenda feita ao templo somente tira proveito quem a fez; mas da esmola tira proveito tanto quem a faz como quem a recebe. O dom dado para o templo pode ser motivo de vanglória; a esmola, entretanto, somente é sinal de amor e caridade.

De que serviria adornar a mesa de Cristo com taças de ouro se o próprio Cristo morre de fome? Dá primeiro de comer ao faminto, e em seguida, com o que te sobrar, ornamentarás a mesa de Cristo. Queres fazer oferenda de taças de ouro e não és capaz de dar um copo de água? E de que serviria recobrir o altar com lenços bordados de ouro, quando negas ao próprio Senhor a veste necessária para cobrir a sua nudez? O que ganhas com isso? Diz-me se não: Se vês a um faminto com necessidade do alimento indispensável e, sem preocupar-te com a sua fome, o levas para contemplar uma mesa adornada com baixela de ouro, te agradecerá por isso? Não se indignará ainda mais contigo? Ou, se, vendo-o vestido de farrapos e morto de frio, sem lembrar-te de sua nudez, levantas em sua honra monumentos de ouro, afirmando que com estes presentes o está honrando, ele não pensará que queres zombar de sua indigência com a mais sarcástica de tuas ironias?

Pensa, portanto, que é isto o que fazes com Cristo, quando o contemplas errante, peregrino e sem teto e, sem recebê-lo, te dedicas a adornar o pavimento, as paredes e as colunas do templo. Prende lâmpadas com correntes de prata, e te negas a visitá-lo quando ele está acorrentado na prisão. Com isto que estou dizendo não pretendo proibir o uso de tais adornos, mas afirmo que é absolutamente necessário fazer um sem descuidar do outro; mais: exorto-vos a que sintais a maior preocupação pelo irmão necessitado do que pela decoração do templo. Realmente ninguém estará condenado por omitir este segundo; mas os castigos do inferno, o fogo inextinguível e a companhia dos demônios estão destinados para aqueles que descuidem do primeiro. Portanto, ao decorar o templo, procurai não desprezar o irmão necessitado, porque este templo é muito mais precioso que aquele outro.

São João Crisóstomo, Patriarca de Constantinopla (séc. V)

† † †

“O Rico Epulão E O Pobre Lázaro”

Havia um homem rico que se vestia de púrpura. E visto que se faz menção do nome, parece tratar-se mais de uma história que de uma parábola. Com toda intenção o Senhor nos apresentou aqui a um rico que desfrutou dos prazeres deste mundo, e que agora, no inferno, sofre o tormento de uma fome que não se saciará jamais; e, não sem motivo apresenta, como associados aos seus sofrimentos, aos seus cinco irmãos, a saber, os cinco sentidos do corpo, unidos por uma espécie de irmandade natural, os quais estavam abrasando no fogo de uma infinidade de prazeres abomináveis; e, pelo contrário, colocou a Lázaro no seio de Abraão, como em um porto tranquilo e em um abrigo de santidade, para ensinar-nos que não devemos deixar-nos levar pelos prazeres presentes nem, permanecendo nos vícios ou vencidos pelo tédio, determinar uma fuga da ascese.

Trata-se, portanto, desse Lázaro que é pobre neste mundo, porém rico diante de Deus, ou daquele outro homem que, segundo o apóstolo, é pobre de palavra, mas rico de fé – na verdade, nem toda pobreza é santa, nem toda riqueza repreensível, mas do mesmo modo que a luxúria contamina as riquezas, assim a santidade recomenda a pobreza –, ou do homem apostólico que conserva íntegra sua fé, que não busca a beleza nas palavras, nem a reserva de argumentos, nem tampouco as luxuosas vestes da frase, posto que este tal já recebeu a sua apropriada recompensa quando lutou contra os hereges maniqueus: Marcião, Sabélio, Ário, Fotino..., reprimindo os desejos da carne que, como foi dito, serve de incentivo aos cinco sentidos, a saber, desse que recebeu a recompensa que lhe foi prometida, quando lhe foi entregue, em pagamento, riquezas superabundantes e um soldo perpétuo.

E não é que creiamos que seja errado sustentar que esta passagem se refere à crença de que Lázaro recolhe da mesa dos ricos, esse Lázaro cujas úlceras, segundo o texto, davam repulsa ao rico epulão, que entre banquetes luxuosos e convites cheios de perfumes não podia suportar o mau odor dessas chagas que os cachorros lambiam àquele que sentia fastio até do odor do ar e da própria natureza; e de fato não existe dúvida que a arrogância e o orgulho dos ricos têm sinais próprios para manifestar-se. E de tal maneira estes se esquecem que são homens, que, como se estivessem acima da natureza humana, encontram nas misérias dos pobres um incentivo para as suas paixões, riem-se do necessitado, insultam ao mendigo e saqueiam a esses mesmos dos quais deviam se compadecer.

O que quiser pode aderir, como um novo Lázaro, aos dois pontos de vista.

Santo Ambrósio, Bispo de Milão (Séc. IV)

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